segunda-feira, dezembro 28, 2009

Desafio em Dezembro


Fim do ano, fim de desafio 2009, fim talvez do blogue. Ou talvez não, se verá. Deste ano levo 120 livros nos olhos, que na cabeça não me cabe tanto, e já com lugar prometido na biblioteca em construção na casa de Poiares. Neste mês, leituras para rir (111), para acompanhar programas escolares - desculpa para subirem na lista de espera (113, 114, 116), para enternecer (112), para ler o que se sabe que será bom sempre (117), para ler o que é oferecido (115, 118), para acabar com os livros de Agustina (119), este comprado porque era necessário lê-lo depois de ter lido As Fúrias (devia até ter sido antes...).
Para o ano de 2010 o desafio será mais comedido, com 80 títulos. Espero! E mais filmes, mais saídas, mais vida para além da vida das palavras, a minha favorita...


Livros:

111. Gato Fedorento. O Blog, Cotovia, 320p.*****
112. Gatos e Mais Gatos, Doris Lessing, Cotovia, 168p.*****
113. Evocação de Sophia, Alberto Vaz Silva, Assírio & Alvim, 112p.****
114. A Minha Primeira Sophia, Fernando Pinto do Amaral, D. Quixote, 46p.*****
115. O Resto da Minha Alegria, Valter Hugo Mãe, Cadernos do Campo Alegre, 64p.***
116. Textos Escolhidos, Padre António Vieira, RTP/Verbo, 190p.*****
117. Levantado do Chão, José Saramago, Caminho, 486p.*****
118. Mais Perto do Céu, Maria do Céu Nogueira, ed-AGAL Criaçom, 110p.***
119. A Crónica do Cruzado Osb, Agustina Bessa-Luís, Guimarães, 226p.***
120. Gabo. Memórias da Memória, Carlos Fuentes, Dom Quixote, 48p.****


imagens retiradas daqui


Filmes:

26. Como Sobreviver a Um Coração Despedaçado, Paul Ruven**
27. Avatar, James Cameron****
28. Surf's Up, Ash Brannon e Chris Buck***
29. Eragon, Stephen Fangmeier****
30. Stardust, Matthew Vaughn***
31. Capuchinho Vermelho. A Verdadeira História, Cory Edwards****
32. Ocean's 13, Steven Soderbergh****
Outros:

Mary Bryant, Peter Andrikidis (mini-série)****
Pushing Daisies, de que já falei algures por aqui, vi finalmente, numa noite e numa tarde, sem conseguir parar e com muita vontade de comer tartes daquelas, os 13 episódios da segunda temporada, e é sem sombra de dúvidas a minha série (que me perdoem Anatomia, Sete Palmos de Terra, entre algumas outras)*****.

domingo, dezembro 20, 2009

Poema de Natal 2009




Natal

(à avó)


Ficou vazio o teu lugar à mesa. Alguém veio dizer-nos
que não regressarias, que ninguém regressa de tão longe.
E, desde então, as nossas feridas têm a espessura
do teu silêncio, as visitas são desejadas apenas
a outras mesas. Sob a tua cadeira, o tapete
continha engelhado, com a tua ida.
Provavelmente ficará assim para sempre.


Noutro Natal, quando a casa se encheu por causa
das crianças e um dos nós ocupou a cabeceira,
não cheguei a saber
se era para tornar a festa menos dolorosa,
se para voltar a sentir o quente do teu colo.

Maria do Rosário Pedreira
Eis a morte de um amigo: ficar sozinho mais um pouco para sempre.

sexta-feira, dezembro 18, 2009

quinta-feira, dezembro 10, 2009

sem título

E assim se esgotam as palavras

as imagens

eu.





até a um dia diferente

que chegará.

sábado, dezembro 05, 2009

Desafio em Novembro


(Imagem retirada daqui)

Mudei de casa, em Braga, muitas coisas estranhas aconteceram, entre elas outras menos, como apanhar gripe (talvez A) ou apaixonar-me e voltar a desapaixonar-me e voltar a apaixonar-me sempre da mesma forma parva pela mesma pessoa. Mas enfim, as coisas parecem estar a ficar mais tranquilas, estão também a chegar as férias e tudo se vai orientar.
Mas concluí o meu desafio :)


Aqui ficam, ainda que atrasadas, as sugestões de Novembro:

Livros:

100. Astérix e Obélix - O Livro de Ouro, Uderzo e Gosciny, Asa, 58p.****
101. Os Incêndios de Roma - Cartas, Séneca e São Paulo, Íman Edições, 72p.****
102. Carta Sobre a Felicidade e Da Vida Feliz, Epicuro + Séneca, BI, 90p.****
103. Novas Crónicas da Boca do Inferno, Ricardo Araújo Pereira, Tinta da China, 224p.*****
104. O Segredo de Brokeback Mountain, Anne Proulx, Bico de Pena, 80p.***
105. Contos da Morte Eufórica, Casimiro de Brito, D. Quixote, 140p.***
106. Caim, José Saramago, Caminho, 182p.***
107. Passarinhos, Anais Nin, Bico de Pena, 152p.***
108. A Maior Flor do Mundo, José Saramago, Caminho, 28p.****
109. 90 Livros Clássicos para Pessoas com Pressa, Henrik Lange, 190p.****
110. A Mecânica do Coração, Mathias Malzieu, Contraponto, 144p.*****


Filmes:

24. Ensaio Sobre a Cegueira, de Fernando Meirelles (outra vez, com a Sandra)*****
25. Doce Novembro (na RTP2)****

Mais:

O Luandino é realmente fantástico. Adorei ouvi-lo e conversar com ele um bocadinho na 100ª Página, uma livraria de Braga que está a comemorar o décimo aniversário.

de volta

após as atribulações das últimas três semanas.
Depois conto, ou não.

Agora vou é dormir, que preciso.

quarta-feira, novembro 11, 2009

não te sei a dormir

mas

ouve-me
como se fosse um
sonho

sem possível.

quarta-feira, novembro 04, 2009

O suficiente para a frente,


não é, Sandra?
(visto em Santiago)

terça-feira, outubro 27, 2009

Santa Margarida

Já tenho as chaves da casa nova. É na rua supracitada.

E só para mim :)

(e os meus milhentos livros e outros eus)

domingo, outubro 25, 2009

desafio em Outubro

Espacio para la lectura, Santiago de Compostela

Em tempo de trocar de casa - finalmente, embora não por ter demorado a procura, pois a única que fui ver me atraiu logo - tempo também para arrumar esta outra casa, a virtual. Não tenciono voltar cá nos próximos tempos, pelo menos para escrever: os testes acumulam-se, a preparação de aulas sobre obras integrais, a mudança e adaptação. Assim, antecipo já o desafio/sugestões, que não são muitas, concedo, porque a viagem, a Diana e o trabalho deixaram-me cansado (que já estava, da conclusão da dissertação). Mas isto vai animar e já só falta um livro para terminar o desafio :)

Livros:

96. Enciclopedia da Estória Universal, Afonso Cruz, Quetzal, 134p.*****
97. Ética Para Um Jovem, Fernando Savater, D. Quixote, 160p.****
98. Anões e Pigmeus da Pátria, Adulcino Silva, Erasmos, 94p.*
99. Um Deus Passeando Pela Brisa da Tarde, Mário de Carvalho, Caminho, 320p.*****

Santiago de Compostela

Vista geral, a partir do jardim Carlomagno.


Tinha prometido, cumpro em parte: só imagens, sem grande relato. Há coisas ficam mais guardadas do que reveladas na memória pessoal. E para não priveligiar umas em função de outras, ficam no caderno pessoal do tempo. E as imagens, por vezes, falam por si. Algumas, das cerca de 200. Acrescento só que não me importava de morar lá, uns tempos. Mas mesmo nada.


As lojas das recordações e afins... perdição nos doces e nos típicos.


San Martín Pinario - muito interessante.




Catedral do meu Sant'Iago.


Vieira no chão... muitas por todo o lado!
P.S. - mais fotos aqui.

Diana Krall no Porto



Foi dia 11. E foi genial.


Apesar de não totalmente cheio, o Rosa Mota estava ao rubro com a sua presença sedutora e enérgica, com a sua voz inconfundível e a sua técnica ao piano. E com a ajuda de Anthony Wilson (guitarra), Ben Wolf (contrabaixo) e Karrien Riggins (bateria). Floreados, improvisos, novos arranjos em músicas tão conhecidas, do passado, como «I Love being here with you», «Cheek to cheek», «Deed I do», «I was doing alright», «Case of you», «Let´s fall in love» ou «Let's face the music and dance» e músicas tão conhecidas do novo álbum (que revisita em grande parte clássicos anglófonos mas sobretudo brasileiros), como «I've grown accustomed to his face», «So Nice», «Quiet Nights», «The boy from Ipanema» e «Este seu olhar» - em português, mesmo e já não tenho certeza do «Walk on by». Muito divertida, intensa, com confidências, tentativas de falar português, simplicidade e simpatia.




Agora o negativo: a pontualidade dos espectadores - muito fraca. Eram 22:15 e ainda havia muita gente a entrar. Fosse outro sítio e ficavam na rua. O pavilhão também não foi o local mais indicado - por vezes, com as palmas, deixava de se ouvir o que a senhora dizia, e ela notou-o, brincalhona ("Só vou falar Português quando estiverem a bater palmas"), e por isso o público conteve-se um pouco. Casa da Música ou Coliseu poderiam ter sido mais apropriados, talvez. Já para não falar das cadeiras, muito desagradáveis.


Para saber mais leia-se o Blitz. Sobre o último álbum, Quiet Nights: ideias, influências, elaboração, veja-se aqui. E muitos vídeos circulam por aí, como aqui.

Caim, perdão, cair ou afim


«Abri um dos rolos e li, ao acaso:
"... E ouviram a voz de Deus que percorria o jardim, tomando a brisa da tarde..."
Ali se relatava, em grego vulgar, um mito da criação do mundo por uma divindade que deambulava em jardins, ao refresco da brisa. A narração pareceu-me primitiva, um tanto incongruente e mal pensada, nada que se comparasse à lenda de Deucalião e Pirra. Fui tomando os rolos e rodando-os, sempre ao acaso: havia intermináveis enumerações, heróis que viviam centenas de anos, lamentações, apóstrofes, traições, guerras, extermínios, tudo exposto num estilo bárbaro, repetitivo, obscuro. Tudo me pareceu brutal, intolerante, sanguinário. Não o serão menos os nossos mitos e lendas. Mas no meio das violências e das felonias há sempre, entre nós, um exemplo de clemência e grandeza de alma que se avantaja e fica como regra da humanidade para os tempos vindouros. No entanto, alguns daqueles textos lisonjeavam a inveja, o desamor dos outros, a sede de matança, como se fossem virtudes. São assim esses deuses bárbaros. Aceitam sacrifícios humanos, apraz-lhes o sangue e o odor das carnes calcinadas. Dessa feição era aquele abominável deus de Cartago, Bel, que nunca se fartava das cinzas dos impúberes e que, em boa hora, nós, romanos, derrubámos.
Admito que a leitura breve e porventura superficial daqueles livros fosse insuficiente para formar uma ideia de todo o conjunto. Talvez estivesse a ser injusto ou preconceituoso e as partes edificantes as contivessem as folhas que não li, que foram as mais.
(...)
Mas não deixa de ser estranha uma religião que precisa de tantos textos e se funda em tantos milhões de palavras.»

Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde
, Mário de Carvalho, Editorial Caminho, 1994, p.289-290

domingo, outubro 18, 2009

Tralhas Grátis

É o nome de um blogue que descobri por acaso durante as férias deste ano. E deve haver mais do género, mas fiquei-me por este. E já recebi muita coisa por causa dos posts que vão surgindo lá. Coisas que se vão juntando à pilha de «Expressos» e «Únicas», «Sábados» e «Visões», «Voltas do Mundo» e «Ler», que tenho à espera de dias menos cheios. Coisas como a «Time» (oferecem quatro números) e a «Saudi Aramco World» (dois anos), cartões Smile, 15 euros cheque-Fnac que já gastei oferecidos um passatempo de que até falei aqui, o Alfabeto braille, o material giro da Sociedade Ponto Verde (canetas de madeira, borrachas, revistas, autocolantes e um livro), um livro de biologia da Universidade de Coimbra, e o que ainda poderá vir. Mas há sempre anúncios de passatempos e concursos, para filmes, cosméticos e afins, viagens, estadias, livros, concertos e outros que tais. Coisas engraçadas, mesmo que não todas para mim. Há para todos os gostos e necessidades.
Nota: não é o blogue que oferece, tão-só anuncia, descobre, informa, encaminha. E fá-lo muito bem!

Memoirs of an Imperfect Angel


É a voz da minha adolescência. E ouvi-la faz-me ser menos velho. Mas não é só por isso que a ouço, penso. Gosto mesmo da voz, que se pode fazer ou responder a quem me diz que não percebe, eu tão erudito e tal, pouco tolerante em relação a lixo que por aí anda. Mas esta senhora não é diferente do que para aí anda, muito. Muito trabalhinho, que ninguém faz as coisas por ela nem a voz lhe caiu do céu. Sim, alguma loucura e excessos, mas isso é o espectáculo... E parece que anda mais calma, mais elegante e moderada, mas isso agora...
17 músicas mais quatro de remix de «Obsessed». 17 músicas com traços mais ou menos comuns: uma certa suavidade, com batidas que lembram o estalar de dedos, com continuidade, por vezes, entre elas, como se prolongamentos ou variações, de fácil audição, para ouvidos menos habituados a muitas vozes (sempre dela, às vezes com coro) a fazer cambiantes e com os seus registos impressivo/impressionantes. Um bom álbum, tido por alguns como o melhor dela nesta década. Talvez menos comercial, como se tem visto pelas vendas, mas mais intimista, mais maduro, mais álbum e não apenas um conjunto de canções justapostas. Está de parabéns a senhora e seu grupo de trabalho. Falta uma ou outra balada mais à anos 90, talvez. E o desfecho, com o «cover» dos Foreigner, podia ter sido alargado, numa exploração intensiva/excessiva que levasse os três minutos e pouco a cinco e tal.
Gosto especialmente de «Betcha Gon Know», a abrir, «Ribbon», «Standing O», «Up out my face» (as duas versões - pena não se apostar em coisas parecidas como a segunda versão, que lembra uma banda num campo de futebol ou coisa assim), «More than just friends». Mas o melhor está mesmo no final: «Angel (Prelude)», a mostrar que os seus dotes vocais ainda estão lá, mesmo que por vezes um pouco disfarçados, «Angels Cry» e «Languishing», duas belíssimas baladas emotivas, e «I want to know what love is», que só peca por ser tão curta.
Já tenho na estante dos cds (o cd tem uma estética interessante, mas a revista da «Elle» que o acompanha não é assim tão interessante como se dizia) e no pc. E ouço amiúde, muitas das músicas. Mais informações, ver o sítio oficial, ou outros, como aqui ou aqui, para ouvir, aqui.

terça-feira, outubro 13, 2009

brevemente

os relatos de Santiago e do concerto de Diana Krall... isto anda tudo atrasado, pois o tempo, que existe, não chega para tudo, porque ando muito cansado...

sexta-feira, outubro 02, 2009

A Poesia de Arlindo Barbeitos

Como prometido num post anterior, aqui ficam alguns poemas de Arlindo Barbeitos, cuja obra me deu muito trabalho nos últimos anos para conseguir escrever uma dissertação.
Selecção não comentada, subjectiva, como quase todas. Respeita apenas a ordem de publicação das obras: Angola Angolê Angolema - AAA - (edição bilingue Português/Alemão, Amesterdão, 1974; edição portuguesa, Lisboa: Sá da Costa, 1976, edição angolana, Luanda: União dos Escritores Angolanos, 1976), Nzoji - N - (Lisboa: Sá da Costa, 1979, Luanda: União dos Escritores Angolanos, 1979), Fiapos de Sonho - FS - (Lisboa: Vega, 1992, Luanda: União dos Escritores Angolanos, 1993) e Na Leveza do Luar Crescente - LLC - (Lisboa: Caminho, 1999).


Angola Angolê Angolema

árvore sem sombra
mulher sem sexo
vento sem poeira
cão sem rabo (p.18)

****
eu quero escrever coisas verdes
verdes
como as folhas desta floresta molhada
verdes
como teus olhos
que só a saudade deixa ver
verdes
como a menina duma trança só
que soletra em português sa-po sa-po
verdes
como a cobra esguia que me surpreendeu
naquela cubata sem outra história
verdes
como a manhã azul
que acaba de nascer

eu quero escrever coisas verdes (p.26).

****
um homem de chuva
jaz morto no chão de folhas podres

talvez só os pássaros
que parecem fazer ninho
nas ruínas das casas de nuvem
possam dar notícia

um homem de chuva
jaz morto no chão de folhas podres (p.31)

****
matar uma andorinha
é pecado
diz o meu povo

assassinar um homem
é crime
diz a tua lei

no entanto

naquele ano
que afirmavam de graça
a morte
de gorda
não se podia curvar (p.41)

****
para ver
se o camaleão
tomava a cor vermelha
do fogo
tu o botaste, meu irmão
na queimada grande

então
ele ficou castanho
porque assado. (p.55)


Nzoji

o
menino
pequeno
muito pequeno
nu
tudo nu
traz botas
botas muito grandes (p.3)

****
no céu amendoado de teus olhos
vejo estrelas
que são bombas (p.4).

****
o mabeco raivoso abriu a boca e comeu o vento
o menino sujo atirou pedras ao céu
a pacaça ferida caiu na lama da lagoa sem água
a mulher grávida quebrou a sanga vazia
o bode velho tentou de novo cobrir a cabra sem leite (p.8).

****
vogando
vogando vem
um dongo
sem ninguém
cirandando
cirandando vem
uma menina
sem o seu bem
marchando
marchando vem
um soldado sem vintém
voando
voando vem
um pássaro que nem asas tem
vogando
vogando vem
um dongo
sem ninguém (p.14)

****
quando o melaço
escorre pelas pontas sem forma
quando o aroma de mel quente
atrai as abelhas
quando as manchas pretas
no fundo amarelo
lembram o leopardo

então
come-se a banana devagarinho
lambendo-se os dedos depois (p. 24)

****
pelas palavras
podia-se crer
que
o falar de milho
faz a lavra
e que
gestos ao longe
são de mudos
em terra de cegos (p.32)

Fiapos de Sonho

roçando
pelo teu rosto
tombou ao chão
a estrela cadente



guarda-a
é o ouro dos sonhos (p.13)

****
ao de leve amanhecendo
abrem-se a flor e o dia
e
meus dedos roçam suaves
tua face inda nocturna
de súbito
rebenta a bomba
na incandescência de luz e orvalho
de uma aurora indiferente


ao de leve amanhecendo
abrem-se a flor e o dia (p.45)

****
a sul do sonho
a norte da esperança


a minha pátria
é um órfão
baloiçando de muletas
ao tambor das bombas


a sul do sonho
a norte da esperança (p.46)



Na Leveza do Luar Crescente

distraída na verdura

a garça branca
repousa sobre uma pata só
apodrecido na morte
o soldado preto
nem pernas tem (p.36)

****
borboletas de luz

esvoaçando
de cadáver em cadáver
colhem
o fedor dos mortos em
vão

e
pelos buracos da renda
dos dias
passam álacres
do mundo do esquecimento
ao país da indiferença
levando consigo
o pólen fatal
das flores da guerra

borboletas de luz (p.38)

****

segunda-feira, setembro 28, 2009

All My Little Words, by The Magnetic Fields




You are a splendid butterfly
It is your wings that make you beautiful
And I could make you fly away
But I could never make you stay
You said you were in love with me
Both of us know that that's impossible
And I could make you rue the day
But I could never make you stay

Not for all the tea in China
Not if I could sing like a bird
Not for all North Carolina
Not for all my little words
Not if I could write for you
The sweetest song you ever heard
It doesn't matter what I'll do
Not for all my little words

Now that you've made me want to die
You tell me that you're unboyfriendable
And I could make you pay and pay
But I could never make you stay

Arlindo Barbeitos: poética da concisão

E pronto, finalmente foi... bem ou mal, melhor ou pior...
27 de Setembro: o peso sai das costas, ou não...

voltarei para partilhar alguns poemas dele.
É que apesar da trabalheira, o gosto pela poesia ficou.

quinta-feira, setembro 24, 2009

Desafio em Setembro

(Irisz Agocs, visto aqui)


Bem, nem vou comentar muito a pequenez deste mês culturalmente, absorto que ando ainda em dissertação, artigos e início de aulas. E como no fim-de-semana vou morrer para o mundo (excepto o almoço no Porto, com as minhas três meninas a caminho de senhoras, e do musical do Colégio) pois vou ultimar a dissertação para segunda ir para a gráfica e até ao fim do mês vou andar um pouco menos calmo que o costume, ficam já aqui as sugestões...


Livros:
91. Trabalho Poético, Carlos de Oliveira, Assírio & Alvim, 400p.****
92. O Passeio e Outras Histórias, Robert Walser, Granito, 118p.***
93. «Inimigo Rumor n.º14», vários - revista sobre poesia, 7 livros, Cotovia, Angelus Novus, Cosac & Naify, 248p.****
94. O Conto da Ilha Desconhecida, José Saramago, Caminho, 40p.*****
Adenda:
95. Histórias ao Telefone, Gianni Rodari, Teorema, 96p.****

mais:
nada ou quase - a Comunidade de Leitores sobre Poesia Contemporânea Portuguesa com Jorge Reis-Sá está adiada; o cinema é uma miragem; as séries o que já falei... e o musical do Colégio, que é sábado.

Já agora, há feira na Assírio & Alvim.

muito fraquinho, mesmo...

quinta-feira, setembro 17, 2009

Um ano depois, novamente a poesia...


... me visita. Um ano e tal, sem escrever um verso. Não sei se isto vale grande coisa, mas tem o valor do regresso. Regressemos, pois.


Quero ser como a luz
em ti

Raio que não quebra
as fibras

Chegar-te, estar-te,
ser-te
em cada forma

Aquecer-te.

(imagem vista algures....)

quinta-feira, setembro 10, 2009

Quase alea iacta est

Acabei agora o segundo e longo capítulo da minha dissertação. Já devia ter sido há um ano, mas a procrastinação está-me no sangue no que toca a escrever as coisas - porque ler e procurar e pensar é logo, mal surja o desafio. E como sempre, o atraso pode iluminar. Numa semana, quase, fiz grande parte do capítulo, mas talvez ficasse melhor com mais tempo de reflexão durante a escrita. Mas está lindo, assim mesmo.
Falta terminar o terceiro capítulo, que é breve. Se fiz tanto em tão pouco tempo, incluindo um artigo sobre Antínoo, que não tem nada a ver com isto, para a revista «Forma Breve», também vou conseguir fazer o terceiro capítulo, a introdução, a conclusão, o resumo, as palavras-chave... rever bibliografia e notas de rodapé. Parece muito, mas há aqui coisas que são muito mecânicas, acho que as faço rápido.
Até dia 30 tem de estar tudo pronto, se a tendinite no dedo indicador direito me deixar e os meus poucos neurónios não fundirem, mas há-de ser antes, porque segunda começam-me as aulas... e acaba o tempo mais ou menos livre que ainda vou tendo...
No final da semana volto para dizer: alea iacta est

terça-feira, setembro 08, 2009

Supernatural/Sobrenatural: do urso ao gato

Não, não estou a insultar as personagens nem os actores. Nem seria insulto, ser um gato.
A sério, esta série tem-me conquistado, ultimamente. Esta última temporada tem sido uma loucura. Como o Dexter, que também tem sido boa. Duas a juntar às outras: Anatomia de Grey, Pushing Daises, Irmãos e Irmãs, Rockefeller 30...
Das muitas cenas hilariantes (e estou a lembrar-me do karaoke coreografado "The eye of the Tiger"), destaco duas:

1.º O ursinho suicida do «why», o nosso ídolo ;) - que não quer tomar cházinho

2.º nós, gatos, somos mais carinhosos, mas também podemos ser assustadores ;)

sexta-feira, agosto 28, 2009

I want to know what love is



Também eu, MC.
Adoro esta versão. E quando ouvir a versão completa do álbum...
(não há vídeo ainda, apareceu hoje na net)

«In my life there is been heartache and pain, I don't know if I can face it again»

quinta-feira, agosto 27, 2009

Desafio em Agosto


Picasso, Girl reading on beach, 1937

Que raio de mês. Preguiça, festas parvas, obras cá em casa. Muitas voltas depois do jantar. Amoras e muita fruta. Muita net e séries. E muita escrita - não a literária, mas a científica. Parece que nem sei escrever. Nota-se.
Mas O Velho e o Mar em curta apaixonou-me, e vi algumas coisas não recomendadas a menores. E apanhei sol e noites de insónia à custa de livros empolgantes, curtinhos, pois então, porque o tempo tinha de ser canalizado.

Livros:

81. A Vida Sexual das Palavras, Julían Ríos, Quetzal, 232p.****
82. Werther, Goethe, Visão, 126p.****
83. O Conde d'Abranhos seguido de A Catástrofe, Eça de Queirós, Porto Editora, 190p.****
84. Contos, Edgar Allan Poe, Jornal de Notícias, 414p.****(*)
85. Praça de Londres, Lídia Jorge, D. Quixote, 98p.****
86. As Afrodites (2 vols), Andrea de Nerciat, Périplo, 256+272p.**(*)
87. A Honra Perdida de Katharina Blum, Heinrich Boll, Visão, 96p.****
88. Haldred, Patrick Besson, Teorema, 116p.****
89. Todas as Estrelas do Mundo/O Amor Tem Tantos Nomes, Carlos Lopes Pires/Maria Rosa Colaço, Editorial Diferença, 168p.****
90. O Anjo de Timor, Sophia de Mello Breyner Andresen (com ilustrações de Graça Morais), Marco de Canaveses: Cenateca, 36p.*****

Filmes:

18. Cleópatra, de Joseph L. Mankiewicz, com Elizabeth Taylor, Richard Burton, Rex Harrison,...****
19. Demasiada Carne, de Jean-Marc Barr e Pascal Arwold, com Jean-Marc Barr, Rosanna Arquette, Elodie Bouchez***
20. Van Wilder, de Walter Becker, com Ryan Reynolds, Tara Reid**
21. O Velho e o Mar, de Aleksandr Petrov (curta-metragem animada)*****
22. All About Anna, de Jessica Nilson, com Gry Bay, Adrian Bouchet, Ovidie, Eillen Daly**
23. Something New, de Sanaa Hamri, com Simon Baker, Sanaa Lathan***

quarta-feira, agosto 19, 2009

Quem se lembra de Sophia?

Encontrei este sítio por puro acaso e gostei. Muita informação, bem "arranjada", útil em contexto educativo - os alunos gostam de coisas com ar informático.

Organizado por décadas, contém ainda depoimentos dos filhos, muitas fotografias, textos de estudiosos sobre a obra, sobre a intervenção cívica...

Só me pareceu um pouco lento...


Eu lembro! E faço questão de a mostrar/lembrar aos meus alunos...

terça-feira, agosto 18, 2009

Sabores

A taste it é um projecto interessante sobre o significado do Sabor. E para isso, pedem a cada um uma palavra que o defina. Bora lá preencher aquela «nuvem» e dar vida ao «coração». Além disso, tem um design engraçado.

É até oferece prémios! Confiram:
Link: http://www.yourtaste.is/



sábado, agosto 15, 2009

to build a home



Porque todos somos casas. Uns mais do que outros. Uns para uns ou outros - ou quase.

E há casas que não entram em ruínas. E jardins.

«A minha casa tem uma varanda: é dela que vejo o mundo. Eu acho que toda a gente tem uma janela, e talvez até uma varanda. Só não estou certo sobre se toda a gente tem uma casa.»

Todas as estrelas do mundo, Carlos Lopes Pires

quarta-feira, agosto 12, 2009

excertos de «O mundo não passa de mundo» - 2.ª parte

Porque o projecto está adiantado, milagrosamente, porque esteve atrasado - e muito, e antes ainda do conto mais exigente, título homónimo do conjunto todo, pausa para seleccionar pequenos momentos de alguns contos.


III. 27. Endymion

Percebes agora porque digo que hoje, ao ver esta lua extraordinária, algures na Grécia, deve estar um rapaz que dorme de olhos abertos, fitando-a e sonhando-a? E quem diz Grécia diz aqui, neste momento, em que estamos sozinhos frente a frente e o mundo pode ser só nosso, por agora, sem inveja dos deuses… Vamos juntos envelhecer mais ao longe?


III. 30. O gato a tinta-da-china

O seu autor reparou em tudo isto e achou que era um bom desenho, um entre muitos que tinha feito, guardado, vendido, ou à espera de comprador. Foi o caso deste. Cansado de tantos desenhos, de tantos traços a preto sobre o branco, não entendeu a maravilha que era aquele gato e a sua vontade de um afago. Não reparou, cheio de sono, que o gato mudava de posição, rebolando-se no espaço mínimo branco da página, quase com perigo de vida pelas margens abruptas da folha para o abismo. E ao ver-se ignorado, não tentou outras abordagens: talvez pudesse ter miado ou arranhado o papel, mas deixou-se ficar, ferido no seu orgulho de gato e tornou-se indiferente.


III. 33. História de uma viagem indecisa

A minha atenção era a mesma da do sol: brincava com os ramos das árvores, penetrando nas frinchas que elas deixavam. E eu seguia esses raios como uma escapatória para as palavras pausadas do meu interlocutor, tão diferentes de outras («O que foi?», «Caiu-me alguma coisa na cabeça vinda da árvore… ou das tuas mãos», o meu sorriso confirmou a segunda hipótese).


III. 34. A missiva inexistente de Antínoos

Não te prendas às memórias, Adriano, que tiveres de nós. Mas não te esqueças, também. Tudo em perfeita harmonia, na devida proporção. Eu recordar-te-ei enquanto o tempo permitir a memória. Afinal somos mortais, dependentes dele, sempre. Não sei o que se erguerá para mim dentro destas águas, depois de me perder nelas, mas só poderá ser o prémio de uma vida breve, mas certa, desde que me escolheste para teu lado. Oh, Adriano, eu também te escolho, escolho-te para que continues, para que continuemos juntos no resto do tempo que existe, em que será possível sermos entendidos, como agora eu mesmo nos entendo e imploro que me entendas. Não me lamentes, é de livre vontade que sigo a vontade dos deuses. E só a eles pertence a nossa vida. Somos mortais, mesmo que me deifiques, mesmo que sejas o imperador, e todos os mortais morrem, tal como os deuses parecem não escapar, também… Mesmo que dês o meu nome que te é tão querido e que murmuras nas noites de calor de Roma como se ele te matasse a sede, a uma estrela, por influência do teu avô Marulino, de uma constelação boreal, ela será variável, com um período que durará sete dias, quatro horas e catorze minutos, como se mostrasse que eu pouco mais durei que ela, mas que retorno, de cada vez que alguém pronuncia o meu nome, o nosso amor.


III. 35. O apanhador de conchas

Por fim, sentei-me na areia, em frente ao mar, como se lhe dissesse adeus. Ao longe deveriam estar os meus colegas, em tarefas de bom acolhimento, imaginei depois. Disseram-lhe por onde eu estaria, indicaram-lhe o caminho e encontrou-me. Eu estava a olhar o mar onde lavava algumas conchas que traziam algas com elas. E soube, de repente, que estava ali, por alguma razão que desconhecia. Não era promessa de que nos viria ver. Não era o seu perfume, porque o mar dominava tudo, nem os seus passos, porque o mar abafava-os e a areia não os permite iguais ao costume, nem a sua voz, porque não falou. Ou antes, quem falou primeiro fui eu, talvez querendo surpreender e provocar:

quarta-feira, agosto 05, 2009

Prémio para o Tulisses, em Rabiscos e Garatujas

Novamente a Deniblog decide dar uns miminhos ao Tulisses, desta vez em forma de prémio. Como já o havia feito. Agradeço, citando:

Tulisses - Do menino TUlinho que tem um sorriso traquina e a calma da lua no olhar. Cheio de auto-desafios, promessas cumpridas, incansáveis tentativas literárias, sólidas, convincentes, promissoras. Troca de mimos e autenticidades no texto dedicado ao seu blogue, no seu aniversário, no baobá que lhe ofereci, na valsa que com ele dancei.

terça-feira, julho 28, 2009

Desafio em Julho

E. Hopper, Compartment C, Car 193 [1938]

E o desafio continua. E muito bem, do ponto de vista numérico - é esse o desafio. Do ponto de vista qualitativo também, mas fazem-me falta certos livros que queria ler e não posso... Por tudo, porque penso que me vão roubar tempo à escrita da maldita dissertação, mas enfim... Os livros mais pequenos vão sendo lidos um pouco por todo o lado, como sempre. Os maiores só os inevitáveis: o Mia por quem é, a Agustina porque queria acabar de ler tudo o que tenho dela. Muitos contos (e a grande descoberta do livro de Helena Malheiro), como sempre, alguma poesia, teatro (por influência do Mimarte) e coisas que são necessárias para a escola ou para artigos... Vou de férias, agora. Até ao meu regresso!

68 - O Prazer da Leitura II, vários, FNAC/Teorema, 168p.***
69 - Rei Édipo, Sófocles, FLUC, 82p.*****
70 - Antígona, Sófocles, Fundação Calouste Gulbenkian, 140p*****
71 - A Dança das Borboletas, Wenscelau de Moraes, Independente, 158p.****
72 - O Comum dos Mortais, Agustina Bessa-Luís, Guimarães Editores, 368p.****
73 - Cinco Tempos, Quatro Intervalos, Ana Saldanha, 54p.***
74 - Bestiário, Fábulas e Outros Escritos, Leonado da Vinci, BI, 96p.***
75 - «Ficções 10», direcção de Luísa da Costa, Tinta Permanente, 200p.***
76 - Jesusalém, Mia Couto, Caminho, 296p.*****
77 - «Ficções 11», direcção de Luísa da Costa, Tinta Permanente, 144p.***
78 - O Tamanho do Mundo, Helena Malheiro, 192p.*****
79 - Pederastia na Idade Imperial, Royston Lambert, Assírio & Alvim, 64p.***
80 - A Religião do Girassol, org. de Jorge Sousa Braga, Assírio & Alvim, 68p.****

Filmes:
Idade do Gelo 3*****
Harry Potter e o Princípe Misterioso****(*)

Signs

Não, não encontrei um novo amor com uma história semelhante. Um antigo talvez. E não, não tenho nenhum amor novo. Antigos sim, que ficam sempre. Mas o filme é bom, é bonito. E vale muito a pena. Talvez haja mais coisas que valham a pena.

domingo, julho 19, 2009

A lua


E hoje, mais logo, na RTP2, Luísa Malato no Câmara Clara. A não perder!

********


Foi interessante, e a minha (Fada)Madrinha foi fantástica.
E o objecto artístico mais bonito sobre a lua são duas, parece-me, na música:






E podia ser a Diana Krall, ou Sinatra... Ou literatura - tantos...
Mas eu não sou lunar, pelo contrário ;)

sexta-feira, julho 17, 2009

Hoje, Mia Couto

Mia Couto, na Centésima Página, para falar do novo livro, Jesusalém. Ok, admito, durante muito tempo pensei que era Jerusalém - e achei estranho, porque Gonçalo M. Tavares teve muito sucesso com um livro com este título e assim, tão próximo, parecia-me excessivo... e até pensei que por causa disso o romance tivesse recebido o título de Antes de Nascer o Mundo, no Brasil, mas não foi por isto, então... Sei que comecei a lê-lo, enquanto esperava que me dissessem se continuava ou não no colégio (e sim, continuo), e estou a adorar (só não adorei a ideia de continuar com a minha turma no secundário e de, por razões técnicas, não continuar com a minha turma de segundo ciclo...); não era para ler já, queria esperar pelas férias para apreciar melhor e ler antes tudo o que me falta ler do antes. Mas o Mia vem cá falar hoje e apetece-me ouvi-lo sabendo um bocadinho do que se trata. É muito bom, a fazer lembrar o Terra Sonâmbula e O Outro Pé da Sereia, e a fugir ao anterior, Remédios de Deus e do Diabo - pelo menos para já, o que é bom (e vou ter Estudo Acompanhado...).

segunda-feira, julho 06, 2009

III. 29. E pur si muove


Sentia-se triste como uma casa sem móveis.

Flaubert, Madame Bovary

Os móveis enchiam o espaço interior, e cada um de nós tropeçava, batia, não vivia nele, porque tomavam conta de nós de forma opressiva. Não havia vazio, nem silêncio. E cada um de nós seguiu o seu rumo. Depois, aos poucos, desbaratadas no vento as lembranças e as palavras, queimados que foram os gestos, ficámos sós, eu e a casa. E embora a solidão não doa, entristece. Como a casa sem ti. E perante a minha imobilidade, a minha descrença do vazio que nos tornámos, ela age por mim: de cada vez que olho pelas janelas apercebo-me da mudança como se estivesse num comboio, do que vem e do que ficou para trás, e sempre que me sento no alpendre tenho novas paisagens para apreciar. É a sua forma de ser mais do que uma casa e de me ajudar. Mas alguns sentimentos não se mudam ao mudar-se uma casa, em todos os sentidos.

Mimarte - Festival de Teatro de Braga

Sozinho, com a Virgínia, no Rossio da Sé ou no Museu D. Diogo de Sousa, tenho andado a ver teatro. Já tinha saudades... Depois de ter perdido as três primeiras, comecei a ir ver tudo, excepto a oitava, pois estava exausto... E tem sido muito bom, desde clássicos gregos a abordagens infantis, muito bom.

30 de Junho, As Justiceiras, de Aristófanes, por Teatro ao Largo (Vila Nova de Mil Fontes), encenação de Steve Jonhston - a encenação da comédia parece roçar um pouco, talvez, a revista portuguesa. O texto clássico foi adaptado aos tempos actuais (qual Ágora, a Junta de Freguesia é que é importante, ou o problema dos brasileiros e dos romenos ou ucranianos...), com música e interacção com o público, com alguma coisa que me fez duvidar um pouco do bom gosto, mas isso sou eu, porque toda a gente gostou muito e deu para rir também com qualidade. ***(*)

1 de Julho, Paisagens em Trânsito, de Patrick Murys, por Circolando (Porto), encenação de Patrick Murys - uma peça estranha, sem falas (algumas onoamtopeias e outros sons), repesentada por um único actor e, por vezes, fantoches - um real, um outro encarnado pelo actor, num cenário que recria linhas de comboio, mas também estábulos e tudo o que quisermos imaginar, e malas, muitas malas. Diz o programa é que é sobre o exílio, memórias, e muitas interrogações - é o que o espectador faz, muitas interrogações! ****

2 de Julho, Afonso Henriques, de António José Saraiva, por O Bando (Palmela), encenação de João Brites - uma peça mais direccionada para o público infantil, mas que agradou a todos. A história do primeiro rei português, suas guerras, dúvidas, paixões, num ritmo marcado pelo divertimento, pela música... Muito bom!****(*)

4 de Julho, Agamémnon, de Ésquilo, por Grupo Thíasos do IEC - Fac. Letras (Coimbra), encenação de Lia Nunes - peça do XI Festival Internacional de Teatro de Tema Clássico, recupera a primeira parte da Oresteia, centrada no regresso de Agamémnon depois da guerra de Tróia, e a recepção que dele é feita por sua mulher infiel, Clitemnestra, que aqui é representada por duas actrizes, para transmitir melhor o carácter dúbio da mulher enganadora. Gostei bastante, em especial do Corifeu. ****(*)

5 de Julho, Édipo Rei, de Sófocles, por Grupo de Teatro Clássico ESAD (Málaga, Espanha), encenação de Andreu - não tinha lido o texto (ao contrário do anterior, mas já li, entretanto) mas sabia a história, o qu enão sabia é que ia ver uma representação tão extraordinária: a intensidade trágica da dúvida que pode aniquilar um homem é levada ao extremo: suor, lágrimas, baba (e tenho dúvidas quanto ao ranho) surgem não muito depois da pela ter começado e mantêm-se... e o coro ajuda. Grande desempenho de Chico García como Édipo, mas todos estiveram bem. Destaque ainda para o Coro - excepcional. *****

6 de Julho, Teatroclip, Tin.bra (Braga), encenação de Sónia Sousa, - a pior crítica é não haver crítica... pronto, eu quase cortei os pulsos com o representação de pequenos quadros da vida de uma vila separados por músicas de Amália, mas até gostei da actriz alcoólica, e de uma ou outra saída mas, no geral, foi de bradar aos céus... comédia fácil, com trocadilhos e tiradas demasiado previsíveis, e as entradas e saídas quebravam o que quer que fosse possível existir de interessante. E pareceu-me tãooooo longooooo. **

7 de Julho, Ibéria, a louca história de uma península, por Peripécia Teatro (Vila Real), direcção de José Carlos Garcia - depois de adiado por causa da chuva (no dia 27 de Junho), voltaram e ainda bem. Uma comédia a sério sobre episódios da Península Ibérica, desde as guerras entre os dois países e com os mouros, aos pastorinhos de Fátima, passando pos Inês de Castro (muito bem contada a história), Camões e Cervantes, Aljubarrota (os actores eram pães que relatavam o que acontecia aos espanhóis), Tordesilhas (fantástica a ideia da marcação de território como os animais)... Dois actores e uma actriz fazem de tudo, do início ao fim: reis, rainhas, guerreiros, pães, pastorinhos, papa... tudo centrado neles, sem grandes artifícios técnicos além do excelente trabalho corporal em cena. Destaque ainda para a cena do anel em D. Constança - fantástico! Muito bom, a encerrar. ***** (com Virgínia, Marta e Rui Pedro)

P.S. - para mais informação, fotos, vídeos, ver o links em cada um dos títulos.

sexta-feira, julho 03, 2009

Para a Marta e para a Virgínia - Parabéns!

«E então conto o do que ri, que se riu: uma borboleta vistosa veio voando, antes entrada janelas a dentro, quando junto com as balas, que o couro de boi levantavam; assim repicava o espairar, o vôo de reticências, não achasse o que achasse - e era uma borboleta dessas de cor azul-esverdeada, afora as pintas, e de asas de andor. - "Ara, viva, maria boa-sorte!" - o Jiribibe gritou. Alto ela entendesse. Ela era quase a paz.»

João Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas (Editora Nova Fronteira, 2005)



borboleta é um ser irrequieto.
para vestes usa pólen.
tem um cheiro colorido
e babas de amizade.
descola por ventos
e facilmente aterriza em sonhos.
borboleta tem correspondência directa
com a palavra alma.
para existir usa liberdades.
desconhece o som da tristeza
embora saiba afogá-la.
usa com afinidades
o palco da natureza.
nega maquilhagens isentas
de materiais cósmicos. como digo:
pó-de-lua, lápis solar
castanho-raíz, cinzento-nuvem.
borboleta dispõe de intimidades
com arco-íris
a ponto de cócegas mútuas.
para beijar amigos e vidas ela usa olhos.
borboleta é um ser
de misteriosos nadas.

Ondjaki, Há Prendisajens com o Xão (Caminho, 2004)

sexta-feira, junho 26, 2009

desafio em junho


Vieira da Silva, mais uma Bibliotèque


Continua o desafio, em fase de abrandamento, pois a dissertação tem de estar feita no próximo mês, e quatro artigos me aguardam... De Luísa Dacosta, agora descoberta e ainda à espera que leia os outros livros que tenho (edições muito bonitas da Asa), ao meu já muito conhecido (e genial) Saramago, passando pelo inevitável (depois do filme) O Leitor, poesia (a do Eugénio, finalmente, mas que confirmou a minha não muita adesão ao seu mundo) e contos e micro-narrativas (Augusto Monterroso é muito bom) e até literatura infantil.



56. A Maresia e o Sargaço dos Dias, Luísa Dacosta, Asa, 78p.*****
57. Luísa Dacosta - entre Sílabas de Luz, Asa, 78p.****
58. Natal com Aleluia, Luísa Dacosta, Asa, 78p.*****
59. O Leitor, Bernhard Schlink, Asa, 144p.*****
60. A Jangada de Pedra, José Saramago, Caminho, 350p.*****
61. À noite as estrelas descem do céu, João Pedro Mésseder, Campo das Letras, 60p.****
62. Versões - Mundos (d)escritos em Português, vários autores, CIC - Portugal/autonomia 27, 166p.***
63. A Ovelha Negra e outras fábulas, Augusto Monterroso, Angelus Novus, 120p.*****
64. «Ficções 9», direcção Luísa Costa Gomes, Tinta Permanente, 148p.***
65. Uma Aventura na Amazónia, Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, Caminho, 240p.***(*)
66. O menino que não gostava de ler, Susanna Tamaro, Presença, 40p.****
67. Poesia, Eugénio de Andrade, Fundação Eugénio de Andrade, 660p.****(*)


Filmes:
You don't mess with Zohan*** (pelo ridículo, pelo Adam Sandler, pela Mariah Carey...)
RocknRolla**** (pelo déjà vu - pessoal - não total...)
Sobreviventes***(*)
Happy Feet****(*)

segunda-feira, junho 22, 2009

III. 19. Conto levemente erótico


Olharem-se era apenas o início, pois o olhar ensinava-os sobre as mãos e sobre a pele. E as mãos ensinavam-nos a ver melhor. E depois do olhar, as bocas percorriam-se com uma falta de algo que só os corpos pudessem mitigar. As mãos procuravam-se, exactas de tempo, exactas na procura do improviso, no imprevisto dos corpos reagentes. Procuravam-se e encontravam-se nas planícies, nas florestas. Perdiam-se e achavam-se, cheias, para novamente se perderem e, cheias de saudade, voltarem a encontrar-se. E depois das mãos e das bocas, todo o restante corpo, um contra o outro, explorando-se na pele, nos pêlos, no sangue latejante, como se o tempo não chegasse, como se a vida pudesse ser sempre aquilo, como se as coisas se reduzissem a ambos tornados unos, perdidos nas palavras sussurradas, gemidas, balbuciadas, até os corpos se soltarem novamente e apenas se abraçarem, enquanto entram num outro mundo, sem consciência.
Acordar-se era tarefa do sol na janela ou do despertador. E era nascer para a consciência da individualidade e da solidão. A cama estava desfeita, ele talvez um pouco molhado ainda, mas só. Porque nada do que se passava era real, apenas fruto do desejo presente e das memórias do passado – viventes ambas nesses tempos, funcionantes de modo imperfeito no presente, mas sem esperança de projecção no futuro. E era certo que depois, no banho, haveria de chorar, mas só no banho, para que as lágrimas não se notassem, nem para ele. E que, em outras noites, olhar-se era apenas o início, pois o olhar ensinava-o sobre a mão e sobre a pele e a mão ensinava-o a ver melhor. E depois do olhar a boca ficava expectante do momento em que tivesse de soltar-se em prazer. Sem tempo, sem espaço de vida a mitigar, a inexactidão do mecânico, ainda assim cheio de saudades da pele, dos pêlos, do sangue latejante, do tempo em que a vida podia ser apenas aquilo, as coisas fossem unas de ambos, em que as palavras tinham o poder de trazer um ao outro em segundos de ser.
Até ao dia em que desaprendesse de amar: os olhos recusassem a ver, as mãos a descobrir, a pele a sentir, as palavras a criar. Ou talvez não fosse ainda tarde nesse dia, se os sonhos e a solidão pudessem funcionar como reservatório de emoções. E um dia, ao acordar com o sol a dourar-lhe o corpo extenuado, talvez não precisasse de chorar, pois teria aprendido alguma coisa que o levaria a ser diferente, mesmo sendo o mesmo.

Deolinda, enfim!

Já aqui falei dos Deolinda, por diversas vezes. E aqui em específico contei a primeira das oito tentativas de ver os Deolinda ao vivo. A primeira foi em Vila Real, a segunda foi em Braga (FNAC), mas estava com uma otite, novamente em Braga (Teatro-Circo) não consegui bilhete, tal como não conseguiram para mim em Vila do Conde. Depois foram a Barcelos, e o convite meio estranho e em cima da hora foi posto de parte por vontade alheia, de que dependia, mas a verdade é que não me apetecia muito vê-los por lá. As queimas: Porto (no dia seguinte tinha aulas ou coisa parecida), Bragança (idem, longe), Braga (a companhia/boleia sentiu-se mal, já não deu). A Sandra viu em São João da Madeira e, não conhecendo muito, gostou muito. A minha irmã e o meu primo Marcelo nem chegaram a ver, de tão tarde chegaram ao Queimódramo. A minha prima Rita delirou em Bragança. Mas chegou o dia. Em Vila do Conde, ao ar livre. Muito bom, com a Milai e companhia, e também com a Filipa e o marido. Valeu a pena a espera - e não terá sido o último... O concerto foi muito bom, com todas as músicas, duas novas e uma da Amália. Grande presença em palco da Ana Bacalhau, a cantar as músicas quase sempre introduzidas por uma pequena história, onde «há sempre um problema». E não deixo nenhuma música - há muitas no disco e no youtube...

quarta-feira, junho 10, 2009

Dois poemas de Luísa Dacosta

Entretenimento

Como quem procura conchas à beira do mar,
escolho as palavras para te dizer,
quando o silêncio dos teus braços
vestir o frio dos meus ombros.


Apelo

Atravessa os campos da noite
e vem.

A minha pele
ainda cálida de sol
te será margem.

Nas fontes, vivas,
do meu corpo
saciarás a tua sede.

Os ramos dos meus braços
serão sombra rumorejante
ao teu sono, exausto.

Atravessa os campos da noite
e vem.


A Maresia e o Sargaço dos Dias, Porto: Edições Asa, 2002

dois poemas de Saúl Dias

Lidos no mês passado, e a fazer antevisão do futuro. Além dos dois poemas, dois outros versos.
«Eras uma flor inventada
com milhões de sóis em cada pétala.»

1.
Havia
na minha rua
uma árvore triste.

Quebrou-a o vento.

Ficou tombada,
dias e dias,
sem um lamento.

(Assim fiquei quando partiste...)

2.
Sofro
de não te ver,
de perder
os teus gestos
leves, lestos,
a tua fala
que o sorriso embala,
a tua alma
límpida, tão calma...

Sofro
de te perder.
durante dias que parecem meses,
durante meses que parecem anos...

Quem vem regar o meu jardim de enganos,
tratar das árvores de tenrinhos ramos?

Tarde Azul, poemas de amor de Saúl dias e desenhos de Julio, Lisboa: Bonecos Rebeldes, 2008.
(edição muito bonita, sobretudo pelos desenhos)

terça-feira, junho 09, 2009

Adeus (+ poema, só porque sim)


Entre nós não há apertos de mão. Isso é para os outros. Ou só nos dias de cerimónia: aniversários, primeiras saudações formais, despedidas e regressos para/de férias. E agora não será diferente, apesar das quebras. Estenderemos as mãos e as palavras serão as mesmas, puídas, gastas, apesar do pouco uso entre nós. Ainda não sei se para sempre, se apenas até Setembro, dir-nos-emos adeus. Não como o do poema, embora tu desses um poema que nunca escrevi e que nunca te daria num cartão. Entre nós não há mãos que cheguem - o artifício não me cai. Não esquecerei o momento breve em que tas guardei nas minhas, só para vermos temperaturas. E quem diz mãos diz olhos, risos, palavras. Chega o momento do adeus a passos largos - adeus simbólico, porque já o dissemos há muito. E pois que terminamos. O que se diz a quem se ama sem se poder falar do amor por proibição?


09-06-09


*****

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

Eugénio de Andrade, Poesia

terça-feira, junho 02, 2009

Forma Breve 6

Acabo de receber o meu exemplar da revista. E uma carrada de separatas. O meu artigo é pequeno, fofinho, sobre o Mia. Um trabalho de seminário do mestrado para o professor Alberto Carvalho. Pode ler-se lá: «"O Embondeiro que sonhava pássaros", de Mia Couto: descrição de uma poeticidade». Não é o meu primeiro artigo divulgado (a minha carreira longa e extensa inclui congressos, colóquios e artigos on-line - sim, claro, pode ver-se a lista ao lado), mas é o primeiro impresso, para já, e isso faz a diferença.

sábado, maio 30, 2009

desafio em maio


E continua o desafio, que, apesar do ritmo ter abrandado, não parece, ainda, comprometido. 55 livros em 5 meses, é bom. Cedi finalmente a ler o Equador, segui para crónicas, por causa da vinda do Ricardo Araújo Pereira ao colégio e por causa de outros à espera, poesia porque não pode faltar, sendo o Saúl Dias um presente de aniversário, e o Sem Sangue porque tinha de ler alguma coisa no autocarro, esquecera-me de trazer um livro e aquele saía com a revista «Sábado» nesse fim-de-semana. Seguem-se Saramago e Luísa Dacosta, entre outros.

48. Equador, Miguel Sousa Tavares, Oficina do Livro, 528p.****
49. Poemas Escolhidos (1990-2007), Fernando Pinto do Amaral, Visão, 112p.***
50. «Ficções 8», dir. de Luísa Costa Gomes, 166p.*****
51. Pif-Paf, Millôr Fernandes, O Independente, 190p.*****
52. Coração Acordeão, Alexandre O'Neill, O Independente, 190p.****
53. Boca do Inferno, Ricardo Araújo Pereira, Tinta da China, 296p.*****
54. Sem Sangue, Alessandro Baricco, Sábado, 158p.***
55. Tarde Azul, Júlio Saúl Dias, Bonecos Rebeldes, 186p.****

Outras sugestões:

Filmes:
O Leitor, de Stephen Daldry, com Kate Winslet, David Kross, Ralph Fiennes*****
Mamma Mia!, de Phyllida Lloyd, com Meryl Streep, Colin Firth****
Frost/Nixon, de Ron Howard, com Frank Langella, Michael Sheen, Kevin Bacon*****
Número 23, de Joel Schumacher, com Jim Carrey**

Festas para o último fim-de-semana de Maio:
Mercado Romano em Braga
Festa de Serralves
Feira do Livro do Porto
Feira dos Minerais na FCUP

quinta-feira, maio 28, 2009

O livro dos dias (breve selecção de Maio - e final)

Desisti do projecto. Por falta de ser. Enfim...

1. Sabemos quase sempre que somos melhores do que os outros e piores do que gostaríamos de ser. Ou é ao contrário? Mas o que interessa ser, se não somos reconhecidos nisso pelos outros? Desisto - sou a desistência em consciência - mas só daqui a meses. Há que sobreviver até à data limite.
Depois virão tempos
ainda
piores.

2. É Ma É La é Ri é A: Malária! Viva a Malária! Vamos! Private jock sem piada nenhuma. Mas que nos fez rir como se fôssemos tolos. A desgraça da vida leva-nos a desejar Moçambique. Para acordar, para fugir, para viver. Ou morrer - pois ela está por lá!

5. Preciso que a minha cama seja mais do que eu.

6. Pequena visão da floresta
peito onde dorme a fera
coração (que vai dar no mesmo).

7. Propostas indecentes
RE: um pouco tarde para propostas indecentes. Talvez noutra altura. (eram já 23:50:16)

10. O coração é aquilo que queremos fazer dele, disse um aluno. E o meu coração apertado alargou-se de espanto. E achou-se sozinho, mas a pulsar. Tem dias.

A nossa música, Borboletras!



para além dos segredos que também os jardins são, sobre o amor e outros, e do amor que a amizade também é. o resto está escrito no caderno que podes ler amanhã. e nos gestos e nas palavras do quotidiano.

Obrigado. Sem ti, o jardim já seria apenas ruína...

«Run», ou o «mudar-me definitivamente»

Ouvi na rádio a versão nova. E lembrei-me da versão antiga. São diferentes, concedo. Mas ambas têm as suas virtudes. E tenho-as ouvido ultimamente, muito. Uma a seguir à outra. Só porque o fim se aproxima, a passos largos. Gosto em especial de «To think I might not see those eyes/Makes it so hard not to cry/And as we say our long goodbye/I nearly do».




terça-feira, maio 26, 2009

da existência

Ainda gostava de saber a razão de toda a gente me falar no msn só quando estou a ouvir músicas de Natal.

E dizem, normalmente, «isso já passou». Mas estamos em Maio e eu ouço. E não poderia ser «ainda falta muito»? Ou o tradicional «o Natal é quando um homem quiser»?

Não me apetece o Natal, nem nada, mas às vezes apetece-me outro tipo de música, diferente da do dia-a-dia, que traga a nostalgia e a alegria ao mesmo tempo. Acompanhada pelos meus berros, pois claro.

segunda-feira, maio 25, 2009

excertos de «O mundo não passa de mundo»

III. 7. O Grito

A poetisa veio ter connosco, convidando-nos para nos juntarmos ao grupo que lá dentro se ia formando no sofá e nas cadeiras dispostas em círculo para a ouvir. Foi nesse momento, de repente, que o grito ecoou pela praia e ressoou pela casa, como se estivéssemos a ouvir um búzio. Todos ouviram e traduziram em silêncio a espera por alguma reacção que se seguisse. Ao fundo da praia, perto do mar, a mulher que tinha passado por nós, vinha a correr, desvairada, chorando. Eu e a mulher do piano acordámos da letargia e descemos as escadas.

III. 8. Borboletras

Era uma vez um homem que escrevia apenas por fragmentos. Coisas pequenas, se bem que muitas vezes profundas, concisas. Há quem ache que as duas coisas estão intimamente ligadas, mas nem sempre. De qualquer modo, os seus escritos compunham-se de fragmentos: frases breves, às vezes não sendo mesmo frases gramaticais, no sentido estrito, ou apenas letras desenhadas pelo prazer de as escrever, sem significarem nada, mas eram sempre pequenas preciosidades, fruto do acaso, da vida, se bem que muitas vezes apenas da interior; escritos a qualquer momento do dia ou do sono, interrompido a custo para a escrita que se poderia perder na manhã seguinte se não acontecesse naquele momento; sobre tudo o que lhe interessava ou causava espécie.

III. 11. Manual de sobrevivência a um coração partido

Na deslocação, revi a minha comunicação sobre um livro medieval recentemente descoberto pelo meu professor numa biblioteca privada e em cuja edição eu estava envolvido. Um livro interessantíssimo sobre a forma de sobreviver a males de amor, em espécie de manual didáctico. Após várias entradas frescas ou mais conhecidas pelo vulgo, o autor anónimo deixava bem claro, no final: «As receitas que i poderam haver, seerá frol quem no mais tender, ca a seu golpe nom pode durar arma». E era sobre este final, de uma certa desesperança na resolução dos casos com a ajuda do próprio manual, que eu ia falar no congresso. Por experiência própria, pois então.

III. 13. O exílio

Doía-lhe aquela existência e não conseguia perceber como poderia sobreviver no seu próprio espaço, voltar a ser o que era. É que estando ela no seu lugar de sempre, como se poderia sentir em exílio? O exilado é aquele que está morto para a sua terra, em parte, pelo menos, e ela sentia-se assim, morta na sua terra, como que exilada antes desta ser sua e fosse apenas um reflexo e algo que nunca poderia realmente existir – a vida.

III. 15. Deus como romancista

Cá fora, vestiu o casaco rapidamente, e circulou, para não se deixar chorar. Mas chorou, a andar, como se fosse um mendigo sem casa – e era-o, naquele momento, sem a melhor casa da vida, a casa dos verdadeiros amigos que nos abrigam o mais importante: o gosto que têm de nós. E ele via-se assim, de repente, sozinho numa rua que não costumava frequentar, com casas que lhe pareciam vazias de vida, embora fossem bonitas. E, por fim, achou a entrada de uma casa onde se sentar e perder-se durante algum tempo. Nada do que se passou a seguir interessa a ninguém. Dos seus vinte e cinco anos de pouca experiência, o professor não sabia o que era perder um amigo de forma tão voluntária. Nem nunca saberia, de facto.

aniversário

Cansado.

Ofereceram-me uma televisão para eu não me deitar tão cedo, para me fazer companhia. Foi uma prenda de anos. Resmunguei, pois claro. E além dos boxers (tamanho acima, enfim), de um livro (poesia de Saúl Dias), de uma carta, um postal, dinheiro, bolos, Expiação com primos, mensagens e chamadas e beijos (que aproveito para agradecer), recebi, um pouco por todo o lado, um número novo na minha conta pessoal.

Agora tenho 26 anos e uma televisão no quarto de cá. Ontem liguei-a para ouvir falar de medos e morte, e para choramingar com a Izzy. Hoje, são quase nove horas, tenho 26 anos e estou pronto para ir dormir.

Ideias...

P.S - E não era esta a companhia de que eu precisava.

Adenda: ao menos já tenho resposta para aqueles questionários tão típicos, quando me perguntarem «Qual foi o pior presente que te ofereceram?» Escrevi coisas bem piores sobre o assunto no meu caderninho actual, mas é melhor não partilhar.

domingo, maio 10, 2009

um poema de Fernando Pinto do Amaral

para a Inês

Aprende o infinito, recupera
a distraída bússula da alma
pouco a pouco sonâmbula, o exausto
sabor da tua vida enquanto é mais
que um recado de lume no teu corpo,
que a promessa da febre no teu sangue,
e a prende sobretudo a suspender
o tempo quando abraça quem morreu
só pra ressuscitar dentro de ti
ao cumprir a memória incandescente
dos dias que o amor transforma em meses,
dos meses que o amor transforma em anos,
dos anos que o amor rasga e entrega
ao rosto azul do céu e destes versos.

sábado, maio 02, 2009

III. 5. Amores imperfeitos



Tinha orgulho no seu jardim. Havia nele flores de várias espécies, recolhidas por várias gerações de que se sentia a herdeira espiritual. Tratava dele como se fossem filhos que não podia ter e conversava com elas como se houvesse resposta às coisas que lhes dizia. Quando uma planta morria, sepultava-a debaixo de outras, como que a perpetuá-la nelas, de modo a que nunca se faltassem. Eram lindas e toda a gente as elogiava na variedade, nas cores, no perfume, na perfeição. Um dia, acordou e viu que a cada um dos amores-perfeitos faltava uma pétala. Sorriu de ironia, a seguir apeteceu-lhe chorar, mas não o fez. Fechou a janela para não se ver e cismou para não emurchecer.